Por Marco Antonio Gonçalves
Bruno Prudente, Andressa Arantes, Priscila Brandão e Hernane Rodrigues formam o Coletivo Nossa Voz, que ocupa uma cadeira na Câmara Municipal
Desde o início do ano, o Legislativo itajubense está convivendo com algo novo. Um gabinete formado por quatro pessoas trabalhando, discutindo, propondo e decidindo juntas como um só representante. O Coletivo Nossa Voz (PT) formado por Andressa Arantes, Bruno Prudente, Hernane Rodrigues e Priscila Brandão trouxe algo novo para a câmara, quer propor o diálogo e quebrar paradigmas.
O Jornal O SUL DE MINAS conversou com os quatro, que foram eleitos com 959 votos. Andressa é a vereadora oficialmente, que participa das reuniões ordinárias e reuniões de comissão da câmara. Os outros três, chamados de covereadores, embora não participem regimentalmente de sessões e reuniões, tem trabalhado em conjunto e dizem que têm sido aceitos enquanto um coletivo.
A vereadora Andressa analisa os primeiros 30 dias de trabalho. “Algumas coisas foram mais tranquilas do que a gente imaginava, outras mais complexas. Estando aqui no espaço da câmara a gente vê que muitas articulações, muito trabalho precisa ser feito fora das câmeras, então muitas decisões que vão para a reunião ordinária, tem que ter muito suor para que aconteça, como na definição das comissões. Todas as articulações exigem comprometimento, tempo e dedicação dos vereadores. Foi algo que a gente teve que adaptar e estamos oficialmente vivendo para isso e por isso”, diz ela, que é a representante oficial do coletivo, ocupando a cadeira de vereadora.
O covereador Bruno Prudente afirma que o grupo tentou abrir espaços de diálogos dentro da câmara. “Acho que alguns colegas (vereadores) esperavam outra coisa, que não houvesse diálogo, às vezes porque não entendem o formato coletivo, às vezes porque não entendem o Partido dos Trabalhadores, e aí eles tinham uma expectativa e a gente mostrou que é diferente, que a gente está aí para dialogar, para tentar mostrar outra configuração, outra forma de propor, de ouvir”, diz ele.
“Na primeira semana apareceu muita demanda, mas aí a gente sentou e resolveu organizar, priorizar, focar em alguns assuntos, para a gente poder saber o tamanho dos problemas e trabalhar de forma pontual. A gente quer abraçar o mundo no começo, mas se a gente não se organizar, a gente não consegue fazer nada”, contou o covereador Hernane Rodrigues.
TRABALHO EM CONJUNTO
Eles afirmam que foram muito bem recebidos na câmara e não tiveram problemas quanto ao espaço e quanto à liberdade de os quatro trabalharem dentro do prédio. Os outros gabinetes têm um vereador e um assessor. No caso do Coletivo, Andressa é oficialmente a vereadora e Prudente é o assessor, mas os outros dois trabalham normalmente no gabinete também.
Prudente diz que é tudo muito novo para todo mundo, mas que o saldo tem sido positivo. “A gente tem tido um tratamento muito positivo, tanto no poder Executivo – eles reconheceram a nós quatro, eles conversaram com todos, enquanto covereadores – e aqui dentro da câmara a mesma coisa. Claro que existem colegas que legitimam mais, outros menos, até por narrativa política deles, aí tem uma restrição maior. Mas a Casa, principalmente os servidores nos acolheram bem, e a gente tem trabalhado desta forma”.
Segundo ele, caso a diretoria da Câmara fosse ao limite, não permitindo que ficassem os quatro, isso não seria legal. “Aqui é a casa do povo, qualquer cidadão pode frequentar o espaço da câmara. É direito de todos nós estar aqui”.
Andressa comenta que o trabalho como Coletivo já é de antigo e por isso flui bem. “A gente já está organizado como coletivo, a gente já trabalha como coletivo há um tempo e um não larga do outro, então se a gente é convidado para uma reunião, os quatro vão para essa reunião, a não ser que seja um impedimento regimental, aí a gente sabe que tem que seguir o regimento, a não ser que a gente o mude. Estamos juntos mesmo, desde o tempo da campanha e antes até”.
A vereadora frisa que as decisões são sempre em conjunto. “Até os discursos, a nossa narrativa, os votos, os documentos que são elaborados, tudo é construído coletivamente”.
“É um trabalho feito a oito mãos”, acrescenta Prudente.
A covereadora Priscila Brandão comenta que nas reuniões de segunda-feira, embora apenas Andressa participe oficialmente estão todos trabalhando. “A gente decidiu que a cada semana um vai junto com a Andressa e a gente fica no nosso grupo comentando, ajudando e trabalhando mesmo. Nunca nos foi fechado a porta da câmara e sempre nos foi dada a oportunidade de trabalhar”.
“O ideal seria a gente ocupar juntos um lugar na reunião ordinária (com apenas um voto) e isso já foi conquistado por outros mandatos coletivos, mas a gente entende que tudo é muito novo e está todo mundo aprendendo com isso”, complementa Andressa.
O Coletivo Nossa Voz já propôs projetos para exigir formação técnica de comissionados e para a regulamentação de artistas de rua
O PARTIDO
A Câmara não tinha um vereador de um partido de esquerda desde o mandato de Paulino Abranches, também do PT, de 2009 a 2012. Em 2016, Célia Rennó foi eleita pelo partido, mas uma manobra política do grupo do então prefeito Rodrigo Riera a impediu de tomar posse.
Priscila diz que a eleição do Coletivo foi uma vitória grande para todos. “A gente teve uma construção na campanha de muita resistência ao partido. As pessoas gostavam da ideia, mas quando a gente falava o partido, as pessoas diziam que a gente estava no partido errado. Teve uma resistência e ter o Partido dos Trabalhadores ter um candidato a prefeito e 17 candidatos a vereador foi uma vitória. Nós ajudamos a construir não só a nossa campanha, mas todas as outras candidaturas. O PT foi dos partidos mais organizados para trabalhar em equipe, por isso que o coletivo teve essa força”.
“Foi uma vitória do partido e também para nós, enquanto coletivo. Uma cadeira para o coletivo Nossa Voz dentro da Câmara não é o fim para a gente. Isso é um meio, a gente tem muito mais coisas para fazer, muitos projetos que estão muito mais fora do que dentro da câmara, mas aqui é o espaço de disputa de narrativa e que é importante, principalmente pra não ficar aquele discurso de um lado só”, afirma Prudente. “Por isso o nome Nossa Voz, porque a gente não se sentia representado e precisava ter alguém com esse discurso mais progressista, mais acolhedor, que tenha a diversidade que a gente não via. Essa vitória significou um espaço de abertura pra gente disputar o que vai ser falado. É novo e é uma conquista muito grande”, garante ele.
Para Hernane houve resistência, “mas a gente percebeu que muitas pessoas que queriam que tivesse um grupo para elas estarem juntas. Pessoas que queriam ter alguém para estar lutando junto e o coletivo trouxe este espaço”.
De acordo com Andressa, “foi uma vitória não só para a galera da esquerda, mas para os outros que se deram a oportunidade de nos conhecer enquanto pessoas e, se fosse resumir, o que o coletivo almeja ocupando uma cadeira na câmara é, realmente, quebrar paradigmas, mostrar que temos um bom trabalho pra fazer e colocar a voz do povo neste espaço, que é algo que a gente sempre acreditou e algo que faz parte da construção do Partido dos Trabalhadores. A gente atende a problemas que não são da direita ou da esquerda, quando a gente fala de saúde, de transporte coletivo. A gente tem este olhar mais humano, mais inclusivo, que a cidade estava precisando e o coletivo possibilita isso”.
CONVIVENDO COM OPINIÕES CONTRÁRIAS
A respeito de vereadores de posições contrárias dentro da câmara, eles pregam sempre o diálogo. “É preciso sentar e conversar. Estamos todos em prol de uma sociedade melhor. É claro que vão surgir divergências em torno de um projeto ou outro, mas isso não impede de dialogar. A gente não pode ser inimigos, vamos trabalhar quatro anos juntos”, diz Rodrigues.
“Acho sensacional quando a gente tem num espaço pessoas que pensam diferente, a discussão se aprofunda mais. A sociedade é diferente, as pessoas são diferentes. Isso é bom para a cidade”, assegura Andressa.
Priscila questiona o rótulo de oposição ou situação. “A gente tem três poderes independentes. A gente combate essa terminologia de situação ou oposição, porque no final das contas todo mundo deveria ser independente, porque o poder legislativo é independente do poder executivo”.
Ela também afirma que o executivo deu uma abertura muito grande nestes primeiros 30 dias. “Nos recebeu enquanto coletivo, abriu as portas das secretarias, tivemos respostas das nossas demandas, por enquanto, está tudo bem, mas isso é uma obrigação. É tudo que deveria acontecer sempre. É importante ter essa harmonia entre os poderes”.
“A gente reforça nosso papel de independente, a gente tem tentado criar pontes com o Executivo. Nestes 30 dias tem tido respostas e diálogo com o poder Executivo e esperamos que continue assim”, salienta Bruno.
MAIS DOIS MEMBROS PARA O COLETIVO
Andressa revelou no mês passado que está grávida de gêmeos. Ela afirma que isso não vai atrapalhar em nada o trabalho dela e de seus companheiros de coletivo. “A gente vai ver como tudo vai correr e tudo indica que os meus bebês vão nascer próximo a um recesso que tem na câmara. Os outros vereadores se mostraram muito abertos a ajudar no que foi preciso. Se tem uma coisa que a gente aprendeu na pandemia foi que dá pra trabalhar virtualmente e os bebês não são nenhum impedimento, muito pelo contrário. São duas mais razões pra gente continuar fazer política pública”.